02/04/2010

Hans Christian Andersen

Foi um 1º de Abril que tinha tudo para dar errado mas consegui ir driblando as encrencas sem perder o bom humor, o que me fez terminar o dia com uma sensação de leveza. Entrei no Facebook e a Madalena havia postado um video com um estudo de Chopin, “Tristesse”, que me tocou e inspirou a escrever. Patrícia gostou do que eu havia escrito sobre o espírito de século XIX e fiz uma nova amiga. Entrei no Google e me deparei com o logo comemorativo do aniversário de Hans Christian Andersen, que eu não sabia que havia nascido num 2 de Abril.


Chopin, Andersen, século XIX, fizeram vibrar em mim uma tecla melancólica, mas de uma melancolia muito diferente da depressão seca e vazia de nossos dias. No romantismo há uma fé, de que mesmo que continuemos sofrendo, existe um sentido nessa tristeza, algo de grandioso e lindo.


Meu encontro com Andersen deve ter sido aos 9 anos, idade em que já havia sofrido uma perda grande. Veio num livro grosso com palavras desconhecidas como “alfaias”, “esquife”, “imponente”, e as belas gravuras originais de Vilhelm Pedersen e Lorenz Frolich. Não parecia livro de criança, e me lembro do prazer que me dava pensar: 463 páginas. Estou lendo um livro de 463 páginas!


Devorei-o sozinha entre os guardados na garagem da casa de meus avós. Engraçado, mas esse livro sempre me lembra daquela garagem. Havia um mezanino onde eu podia me esconder e passar despercebida, tardes inteiras. E viver a iniciação a um universo paralelo, situado no século XIX.

“A Pequena Sereia” eu já conhecia de um pratinho na mesa da sala de visitas; “O Patinho Feio”, tão mais intenso e profundo que as bobagens adaptadas com figurinhas coloridas que  havia visto antes.  Histórias trágicas, como “A Menina dos Fósforos”, mágicas, como “Mindinha”, ou engraçadas, como “A Princesa e o Grão de Ervilha”, mas sempre com aquela tristeza real e humana com que eu me identificava e que ajudava a elaborar a minha própria.

 A adaptação da Disney é um filme bonito, mas nada tem a ver com a Pequena Sereia de Andersen, que é uma história de sacrifício. O que é preciso fazer para tornar-se humano? Confrontar a dor, aquela que irá nos acompanhar por toda a existência e, ainda assim, dançar.


Mas a minha preferida ainda é “A Rainha da Neve”, e hoje sei porquê:  é uma história de cura, uma jornada de iniciação, em sete partes. Gerda calça os seus sapatos vermelhos e parte para salvar Kay, cujo coração está congelado nos palácio da Rainha da Neve, sob a luz da Aurora Boreal. Conhecer-se é uma tarefa gigantesca, dolorosa e sagrada, feita de perdas, encontros, “terror e piedade”.





Com  Andersen comecei a aprender que a vida é magnífica, e que as perdas e a dor também fazem parte dessa beleza.


“Era uma vez um príncipe que possuía tantos e tão belos livros, como ninguém os tinha iguais. Tudo quanto sucedera neste mundo, ele podia ler e ver reproduzido em maravilhosas figuras. Encontrava informações sobre todos os povos e todos os países. Apenas não constava uma só palavra a respeito da localização do Jardim do Paraíso. E era precisamente neste que ele mais pensava.”
Hans Christian Andersen, O Jardim do Paraíso

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